Simplesmente UX

Fausto Mastrella
7 min readJan 4, 2021

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Eu trabalho profissionalmente com tecnologia há 20 anos, entre outras coisas programo em várias linguagens. E desde sempre fui muito apegado em preocupar não somente com o script rodando, a arquitetura, o relacionamento dos dados ou o cálculo sendo executado corretamente por um sistema, mas também me importava como a pessoa que estava usando minha aplicação a enxergava.

Lá atrás, naquela época, eu nem imaginava, mas eu estava fazendo o que anos depois seria conceituado como uma área de TI: a área de User Experience, ou simplesmente UX. “U” de User, e “X”, que em inglês tem som de “Écs” (Xperience).

Também por outro lado, sempre gostei de trabalhar com softwares gráficos e experimentava todos. Já usei Corel Draw para criar elementos de sites e o Photoshop para fazer os slices para gerar tabelas HTML (tá, eu sei, não precisa resmungar, mas era o que tinha na época). Enfim, me motiva muito trabalhar com tudo o que tem design. Gosto de trabalhar com tudo que é bonito de se ver.

Curto inclusive de criação e modelagem 3D, animação, pós-produção e edição de vídeo desde adolescente. Inclusive uma pequena produçãozinha que fiz há uns 15 anos fez muito sucesso aqui na minha cidade de Catalão: Catalão Wars (vou deixar o link aqui — ah, que saudade de quando tinha tempo para brincar esse tipo de coisa…). E por incrível que pareça, esse hobby me ajudou a ter um grande diferencial no meu trabalho: criar animações de diversas microinterações (olha o UX aí).

Então por conta desse meu background, algumas pessoas me chamavam para fazer algum trabalho de design, ou de prototipação de um sistema ou possível produto que estava em fase embrionária. De vez em quando ainda faço algumas consultorias de refinamento de produto (hoje focado em aplicativos móveis).

Depois de um tempão é que vi que, há anos atrás eu praticava, sem saber, UX. Eu imaginava a caminhada de um usuário em um produto até a conclusão de uma tarefa e minha meta é que essa jornada fosse funcional e principalmente bonita e agradável.

Mas UX é isso então? Não! Conceitualmente é: Qualquer relação de um indivíduo tem com um produto ou serviço. Quem inventou o termo UX foi Don Norman, na Apple na década de 1990.

Don (Donald) Norman

Há uns anos atrás na UX Conference em São Francisco, Angie Li (UX Specialist do Nielsen Norman Group) perguntou a Don Norman o que ele achava do termo “UX” nos dias de hoje… e a resposta dele você pode ver no vídeo e na transcrição abaixo, que eu copiei e colei aqui:

Uma vez, há muito tempo atrás, eu estava na Apple, e nós estávamos conversando sobre como a experiência de usar esses computadores era ruim. A experiência, da descoberta, quando você vê ele pela primeira vez ele em uma loja, quando você compra e não consegue colocar ele no carro porque a caixa é muito grande… E quando você finalmente chega em casa, abre a caixa e pensa “Parece assustador. Eu não sei se me atreveria a montar esse computador”.

Tudo isso é experiência do usuário. É tudo relacionado a sua experiência com o produto. E talvez você nem precise estar perto do produto, você pode estar falando sobre ele para alguém.

Isso é o que nós queríamos dizer quando inventamos o termo UX e criamos o que chamamos de “Escritório de Arquitetos de Experiência de Usuário” na Apple para tentar melhorar as coisas. Mas a Apple já tinha começado muito bem. Nós começávamos com um produto bom e fazíamos ele ficar ainda melhor!

Hoje esse termo é terrivelmente mal utilizado. Ele é usado por pessoas para dizer “Eu sou um User Experience Designer, eu faço websites” ou “Eu faço aplicativos”. Eles não têm nem ideia do que estão fazendo, e acham que a experiência é somente aquele dispositivo, website, aplicativo ou sabe quem lá o que!!!

Não, é tudo! É a forma com que você sente o mundo, é a forma que você experiência a sua vida, é a forma que você experiência um serviço, ou… sim… um aplicativo ou um sistema de computador. Mas é um sistema. É tudo! Entenderam?

Caramba, nem precisa falar mais nada de conceito, esse cara é O CARA mesmo! Fala sério…

Para nós de tecnologia, é preciso entender que o sucesso do que fazemos depende dessa ligação sensorial entre o mundo físico e nossos produtos que desenvolvemos. Entregar as experiências completas e que cumprem um objetivo sem dor alguma é o que importará e será relevante de fato para o usuário.

Em 2018 tive a oportunidade de fazer um curso de extensão na ESPM em São Paulo com um cara top em UX no Brasil, Danilo Cruz. Dentre diversas coisas, aprendi a relacionar a psicologia social com UX.

A psicologia diz que o comportamento humano é resultante da interação do indivíduo com o seu meio, e isso é mostrado pela Equação de Lewin (Kurt Lewin, psicólogo alemão criador da Teoria de Campo e considerado o pai da Psicologia Social e da Psicologia das Organizações):

Existe muita ciência por trás do UX. A experiência que um usuário tem é diretamente relacionada aos seus 5 sentidos, e que por sua vez, esses são impactados pelo o que chamamos design. Devemos lembrar que design impacta além do visual. Ele pode ser responsável por fazer a jornada de um produto ser cumprida de forma excepcional ou catastrófica.

Muita gente quando ouve falar em UX, relaciona principalmente ao visual. Espero que nesse artigo já tenha conseguido até aqui mostrar que é algo bem maior: é a relação que uma pessoa tem com um produto, desde o desembalar da caixa se é um produto físico, ou o processo de instalação de um software até a entrega do porquê aquilo existe.

UX Design

A matéria mais importante que liga tudo o que dissemos até agora é o design. Norman dividiu o design em 6 princípios para explicar por que as vezes um produto satisfaz um usuário e outro produto frustra. Aqui um resumo:

  • Visibilidade: mostrar de forma clara o que o usuário terá que fazer em seguida de cada passo do processo, para que não crie dúvidas na sequência das suas ações até o resultado.
  • Feedback: qualquer ação feita pelo usuário deve resultar em uma resposta, seja um som, vibração, algo visual ou outra coisa. Isso evita que falhas no comportamento e otimiza o tempo da tarefa.
  • Restrições: bloquear as possibilidades de equívoco de um usuário restringindo as suas opções de utilização ou fazendo de forma tão perfeita que qualquer interação não resulte em erro.
  • Mapeamento: é mapear os movimentos possíveis de uma interação entre o humano e o produto em si, ou entre os controles e os movimentos de um produto. Quando mapeamos possíveis interações entre as partes temos o entendimento do fluxo de operação como um todo e facilita alcançarmos o sucesso global no produto.
  • Consistência: devemos agrupar elementos similares que resultam em resultados similares. Uma interface consistente é aquela onde existe uma concordância de cores e tamanhos e segue uma estrutura padronizada em seus componentes, o que a torna automaticamente de fácil entendimento.
  • Affordance: Pesquisei e realmente parece que não tem mesmo tradução pro português dessa palavra… mas significa criar algo tão óbvio que, a ser apresentado a alguém, automaticamente a pessoa saiba o que fazer com aquele elemento, componente, interface, produto, etc…

Esses são os 6 princípios de design que se praticados, resultarão em uma excelente experiência do usuário. E outro conteúdo bem famosão no mundo do UX Design é a pirâmide de necessidades, que Steven Bradley (escritor do livro Design Fundamentals — Elements, Attributes, & Principles) criou em 2009:

E UI?

UI significa User Interface. É a área do UX que se preocupa na entrega visual e usa os princípios e conceitos de design para criar uma a experiência que o usuário enxerga, para que ele se sinta bem a utilizar qualquer produto. No mundo de tecnologia podemos entender sendo as telas de qualquer sistema, ou aplicativo, ou site, enfim…

Se você melhora a interface do seu produto com o usuário (UI), como consequência você estará melhorando automaticamente a experiência que o usuário tem como um todo (UX).

E atenção! Você pode ter uma UI incrível, mas um produto extremamente pobre e com má reputação, por não ter UX. A existência de uma interface funcional, bonita e repleta de microinterações de nada é relevante se por fim não se consegue gerar valor no final das contas.

E o contrário também acontece: produtos extremamente bem sucedidos, porém com péssima interface com o usuário, mas que geram muito valor a quem o utiliza. Você consegue identificar alguns exemplos desses casos? Tenho certeza que sim, não é difícil.

Falando de produto em si, comumente as pessoas cometem o erro de acreditar que UX é simplesmente um sinônimo de usabilidade, quando na verdade, usabilidade é apenas um dos pontos de um conjunto de fatores que fazem parte da experiência global.

Deve-se haver um balanceamento entre as sub áreas de UX. Existem atualmente diversas sub áreas, e eu possivelmente vou detalhá-las em outros artigos mais a fundo. Esse texto aqui de hoje é apenas um overview, e espero que tenha te ensinado alguma coisa se você chegou até aqui.

É dever de todo profissional, seja na área de produto ou serviço priorizar entregar uma excelente experiência aos seus clientes.

Dá-lhe UX!

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